Soli Deo Gloria

O que é arte cristã?

Uma reflexão sobre a arte e a cosmovisão cristã

Reflectum
4 min readSep 26, 2018
reflexão sobre cosmovisão cristã, metanarrativas e arte

Quando falamos sobre cosmovisão cristã algumas pessoas podem ficar confusas sobre o que isso realmente é. Ter uma “mente cristã” é muito mais do que recitar versículos em momentos oportunos. É sobre perceber a realidade e com ela se relacionar a partir de uma metanarrativa bíblica.

Metanarrativas são, dentro da filosofia, grandes narrativas de nível superior capazes de explicar e dar sentido a todas as coisas, representando uma verdade absoluta sobre o universo. Não é um termo muito popular atualmente, já que essa ideia foi quase totalmente abandonada durante o século XX, com o fim do período moderno. Uma marca do pós-modernismo é justamente a incredulidade em relação às metanarrativas e, por isso, vê-se tudo como relativo.

A metanarrativa bíblia pode ser entendida como a grande história por trás de todas as histórias que vemos na bíblia: criação, queda, redenção e consumação.

“A mente cristã não é contra o uso de textos-prova, isto é, a ideia de que podemos resolver todo problema doutrinário e ético citando um texto único isolado, enquanto Deus nos deu uma revelação abrangente. Ao invés disso, a mente verdadeiramente cristã enche-se com a totalidade das Escrituras.” — John Stott

Assim, a cosmovisão cristã busca compreender diferentes aspectos da realidade a partir desta verdade absoluta: 1) o universo foi criado e é mantido por Deus; 2) o pecado atingiu a criação e separou criatura e Criador por causa do ser humano; 3) a cruz traz a redenção e leva toda a criação para o caminho de volta a Deus; 4) em breve Deus restaurará todas as coisas.

A mente cristã é, então, uma mente redimida na cruz através do arrependimento. Faz-se importante dizer que o arrependimento não é somente a confissão de pecados. A palavra vem do grego metanóia e quer dizer “mudança de mente”. Arrepender-se não é pedir desculpas a Deus por um erro, é abandonar uma visão caída de quem somos e do que a realidade é e aceitar a Verdade de Deus.

“[Paulo] exorta os filipenses: ‘Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo’ (Fp2:5). Isto é, ao estudarmos o ensino e exemplo de Jesus e colocarmos conscientemente nossa mente sob o jugo de sua autoridade (Mt11.29), começamos a pensar como ele. Sua mente é, gradativamente, formada dentro de nós pelo Espírito Santo, que é o Espírito de Cristo. Nossa perspectiva torna-se alinhada à dele.” — John Stott

O que isso significa na prática?

Podemos citar, já de início, que uma cosmovisão cristã não funciona dentro da dicotomia do secular x sagrado. Pois, tudo pertence a Deus, todas as coisas foram contaminadas pelo Pecado, Cristo redime todas as coisas e tudo será restaurado por Deus. Assim, não classificamos a vida com os rótulos “é de Deus” e “não é de Deus”. Buscamos compreender o que deveria ser, o que é, o que pode ser e o que será.*

E o que a arte tem com isso?

Tudo! Apliquemos o esquema de quatro partes na Arte. 1) Deus nos deu capacidade artística e criatividade; 2) por causa do Pecado nossa produção artística foi corrompida em forma e conteúdo; 3) a Arte pode também ser redimida pela Cruz; 4) Deus irá restaurar a Arte no fim de todas as coisas.

Arte cristã não tem a ver com um tema específico mas como o tema escolhido é tratado. Não é exatamente sobre o que cantamos, mas como cantamos. Podemos pintar uma cena bíblica mas fazê-lo sem credulidade. Podemos escrever sobre o ato sexual a partir da Verdade de Deus (como em Cantares).

Muitos cristãos acreditam que só devem (ou só podem) fazer arte confessional para ser encaixada na liturgia e assim se fecham dentro de um “mundo do gospel”. Onde estão os artistas plásticos que produzem uma arte redimida que não os vejo no museu? Onde estão os atores e bailarinos que contam histórias redimidas que não os vejo nos teatros municipais?

Porque abandonamos uma parte tão importante e grande da sociedade, a arte e o entretenimento, como se a Cruz não tivesse poder para transformar todas as coisas? A transformação que o Evangelho traz não é só sobre minha relação pessoal com Deus. Os artistas cristãos (ou os cristãos artistas) precisam pensar mais sobre o que Arte deveria ser e o que ela pode ser, e é pra isso que o Reflectum existe.

*Trecho inspirado pela palestra de Mariana Lima, coordenadora do Cities Project no Brasil, realizada durante o congresso Agora 2018. O Cities Project é uma iniciativa da Cru, organização missionária internacional, que objetiva capacitar líderes cristãos para a transformação das suas cidades.

Reflexões sobre arte, cultura e teologia. Pensando a prática e a pesquisa em arte dentro de uma cosmovisão cristã.

“Rogo-vos pois [artistas] que se ofereçam em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, esta é a [sua obra de arte]. Não se amoldem ao padrão deste mundo, mas transformem-se pela renovação da sua mente…” Rm 12:1–2

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Reflexões sobre arte, cultura e teologia. Pensando a prática e a pesquisa em arte a partir da filosofia reformacional.

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